Numa sessão tensa na última sexta-feira (24), teve até furto de celular de uma vereadora, a Câmara Municipal aprovou, por 7 votos a 2, o parecer da Comissão Permanente de Orçamento, Finanças, Obras Publicas, Planejamento e Patrimônio Municipal, constituída pelos vereadores Lauriel de Freitas Freire (presidente), Laudelino de Jesus Mendes (relator) e Antônia Edilene Serejo Tertuliano (membro).
Os únicos votos contrários à aprovação foram dos vereadores Aurilânia Barros e Tonico Jacó, que alegaram não terem tido acesso às contas enviadas para Câmara pelo Tribunal de Contas do Estado do Maranhão (TCE/MA), e, portanto, desconheciam o teor das irregularidades apontadas pelo TCE em seu parecer técnico.
De acordo com a vereadora Aurilânia Barros, que teve seu pedido de vista dos projetos de Decreto Legislativo nº 01 e 02/12 negado, não há dúvidas de que a mesa Diretora da Câmara, presidida pelo vereador Raimundo Camilo, violou o regimento interno da Casa, tendo em vista que art.204 afirma que “Recebidos os processos do Tribunal de Contas competentes com os seus respectivos pareceres prévios, a Mesa, independentemente da leitura dos mesmos em Plenário, mandará distribuir cópias aos vereadores e enviará os processos à Comissão de Orçamento, Finanças, Obras Públicas, Planejamento e Patrimônio Municipal, no prazo máximo de 2 (dois) dias.”. Os vereadores Aurilânia Barros e Tonico Jacó afirmaram que não receberam nenhuma cópia dentro do prazo em que estipula o regimento e que os Decretos foram apresentados no momento da votação, enquanto o regimento, no art.107, exige que “nenhuma proposição poderá ser colocada em discussão sem que tenha sido incluída na Ordem do Dia, com antecedência de até 24(vinte e quatro) horas do início das sessões”.
Além disso, de acordo com o art. 203 do regimento interno, “o julgamento das contas municipais dar-se-á no prazo de sessenta dias úteis, após o recebimento do parecer prévio emitido pelo Tribunal de Contas ou, estando a Câmara em recesso, até ao sexagésimo dia do período legislativo seguinte”. Acontece que pela Lei Orgânica Municipal (LOM), art. 47, parágrafo 3º, as contas deveriam estar “à disposição dos interessados na sede da Câmara, durante sessenta dias do seu julgamento”.
Claro, pode-se alegar que de dezembro, mês oficial de recebimento do parecer prévio do Tribunal, até o julgamento na Câmara, que ocorreu no dia 24 de fevereiro, teriam transcorrido sessenta dias, mas com um detalhe curioso: a Câmara estava fechada, pois os vereadores estavam de recesso. Ainda pela Constituição Federal, art.31, parágrafo 3º, as contas dos municípios deverão ficar “expostas durante sessenta dias, anualmente, à disposição de qualquer contribuinte, para exame e apreciação”, mas não se conhece em Buriti um mísero cupim que tenha tido acesso às Prestações de Contas do prefeito.
Percebe-se, com isso, claramente, que os vereadores, ou por desconhecimento, ou por astúcia, atropelaram o regimento interno da Casa e a própria Constituição, numa afronta direta ao Estado Democrático de Direito, onde os poderes exercem a autoridade por meio da lei e a ela também estão submetidos. Logo, fica evidente a ilegalidade regimental e constitucional da votação dos dois Decretos que aprovaram as contas do prefeito referentes a exercícios financeiros de 2006 e 2007.
Compete aos vereadores oposicionistas, portanto, para o bem da sociedade buritiense, juntar esforços para anular, na Justiça, a última votação da sexta 24, por ter ficado claro que ocorreram diversas irregularidades no processo que culminou com a aprovação das contas do prefeito. Uma das mais flagrantes ilegalidades foi a atitude, imoral e ardilosa de burlar o prazo fixado de sessenta dias para exposição das contas aos interessados, garantidos pelo regimento interno, pela lei orgânica municipal e pela constituição federal.
Nos dois pareceres, datado da sessão solene de abertura dos trabalhos da Casa deste ano (15/02), o relator, vereador Laudelino, em seu julgamento diz que houve “excesso de rigor técnico” do TCE/MA na análise das Prestações de Contas dos exercícios de 2006 e 2007. Quer dizer, então, que a Câmara de vereadores analisou com frouxidão as contas do prefeito Neném Mourão? Foi para isso que os atuais representantes do povo foram eleitos?
Há de se destacar nesse posicionamento dos vereadores governistas o fato de o mesmo critério não ter sido utilizado quando, em 2009, da análise das contas, também reprovadas pelo TCE, do ex-prefeito Zé Vilar. Na ocasião, a mesma Câmara, numa análise claramente política, como o faz agora, argumentara que se o TCE, órgão técnico, havia reprovado as contas do ex-prefeito, não tinha razão para a Casa julgar em contrário.
Ora, como todos lembram, naquele momento, estava em curso a cassação do prefeito Neném Mourão, aliás, a primeira na historia de Buriti, e como ato de vingança ao seu principal adversário, foram postas em votação as contas do ex-prefeito que foram, então, reprovadas pela Casa, tornando-o agora um “ficha-suja”, o que lhe impossibilita de concorrer a cargos eletivos, conforme decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a validade da Lei da Ficha Limpa.
Ainda em seu parecer, o vereador Laudelino afirma que as irregularidades administrativas apontadas pelo Tribunal não configuram “dolo ou dano ao erário público”,embora em momento algum o relator apresente elementos técnicos que confirmem sua conclusão. Aliás, nem mesmo na defesa, encaminhada pelo prefeito à Câmara, no dia 16, posterior, inclusive, ao parecer do relator há esses elementos. Ora, a Comissão emitiu parecer antes mesmo de analisar os argumentos da defesa, o que indica que já havia uma clara disposição em aprovar as contas previamente reprovadas pelo TCE/MA.
A afirmação do prefeito, em sua defesa (cheia de erros e citações equivocadas de artigos constitucionais), de que “o dolo e o dano ao erário devem ser provados e não presumidos” é correta, mas fica difícil para os cidadãos buritienses fazê-lo já que o poder legislativo, ao qual foi outorgada tal função fiscalizadora do executivo, através do art. 31 da CF, submete-se cabalmente aos interesses do gestor municipal.
Em sua defesa à Câmara, referente às contas de 2006 e 2007, Neném Mourão, alegando que não houve “dolo, má-fé, efetiva lesão ao erário público ou erro insanável”, tirou o corpo fora das irregularidades apontadas pelo TCE/MA e justifica dizendo que“trata-se de erro do contador que não se esforçou em sanar a irregularidade deixando a Prestação de Contas sofrer penalidade (sic), ora impostas”. Bem, já que a culpa das falhas administrativas é do contador, espera-se agora que, no mínimo, ele seja demitido (e esteCorreio deixa aqui como sugestão o nome do relator do parecer, o vereador Laudelino, já que este sim, junto com seus colegas governistas, “se esforçou” muito para aprovar as contas) e a Câmara deve convocá-lo para dar explicações às supostas falhas, referidas pelo prefeito em sua defesa à Casa.
Na documentação de defesa que este Correio teve acesso chama a atenção não só os erros ortográficos, mas o fato de que na preparação da mesma esqueceram até de mudar a localidade da defesa. Puseram no final Brejo ao invés de Buriti. Isso demonstra realmente que o prefeito é mal assessorado. Prova disso também é outro erro grosseiro na citação, na defesa, referente às contas de 2007, segundo eles “in verbis”, do Relatório de Informações Técnicas nº 149/2010 do TCE, que aponta “descumprimento do disposto no art.25 da Constituição Federal (aplicou somente 19,51% na Manutenção e Desenvolvimento do Ensino)”. Esse artigo constitucional não tem nada haver com o que a defesa alega, reza, na verdade, sobre a organização dos estados federados. Tudo indica que nem o assessor jurídico, nem o relator e nem os vereadores membros da Comissão verificaram esse artigo na constituição Federal por ocasião da análise da defesa. Seria bom que todos os buritienses portassem uma constituição e mais importante ainda seria que os vereadores, pelo menos, a lessem; sobretudo os artigos 29, 30 e 31, que tratam dos assuntos do município, sendo que o art.31 fala da fiscalização que deveria ser exercida por essa Câmara Municipal.
Nas irregularidades apontadas pelo TCE chama a atenção também, e é grave, no RIT nº 149/2010 do TCE, referentes a 2007, o fato de apontar ausência de parecer e atas do Conselho do Fundeb, e naquele ano, para lembrar os leitores do Correio e alertar às autoridades, o município recebeu R$ 4.752.116,37 de Fundeb e R$ 1.143. 785,89 do entãoFundef, ambos, recursos exclusivos para educação.
A função do Conselho é (1) acompanhar e controlar a distribuição, transferência e aplicação dos recursos dos fundos; e (2) supervisionar o censo escolar e a elaboração da proposta orçamentária anual. É composto por, no mínimo oito membros. Sem atas e pareceres desse Conselho fica muito difícil saber quem acompanhou a aplicação correta desses quase R$ 6 milhões de reais do fundo da educação.
A Constituição Federal, art. 212, diz que os municípios devem aplicar, no mínimo, 25% do seu orçamento total em manutenção e desenvolvimento do ensino, o que compreende, conforme o art. 70 da LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), despesas realizadas com vistas a alcançar os objetivos básicos das instituições educacionais de todos os níveis, entre os quais: remuneração e aperfeiçoamento do pessoal docente e demais profissionais da educação; aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino; e aquisição de material didático-escolar e manutenção de programas de transporte escolar.
De acordo com o Relatório do TCE, no ano de 2007, teriam sido aplicados somente 19,51%, faltando ao prefeito justificar, em termos percentuais, como foram gastos 5,49 % do dinheiro obrigatório para educação. Como em 2007 a receita global de repasses para o município, de acordo com o portal da transparência foi superior a R$ 19 milhões, em valores absolutos (mas não exatos, pois a Prestação de contas não foi exposta para os buritienses, o que impossibilitou que este redator apresentasse aqui um cálculo exato) essa diferença percentual pode chegar a quase um milhão de reais que deixou de ser investido na educação
Cabe a este Correio lembrar aos seus leitores, e às autoridades legislativa e executiva, que o Município pode sofrer intervenção do governo estadual, conforme o art.35 da CF, caso não cumpra com o mínimo de 25% exigidos da receita municipal aplicados na manutenção e desenvolvimento do ensino.
O prefeito confirma na defesa que houve, sim, irregularidades administrativas (o que por si só já é preocupante), mas que não caracterizaria improbidade administrativa.
Não se deve esquecer ainda que o prefeito Neném Mourão também já foi denunciado e respondeu Ação Penal no Tribunal de Justiça (TJ/MA), em 2009, por não ter encaminhado à Câmara Municipal a prestação de contas referente ao seu primeiro ano de mandato, 2005, sendo absolvido em 16 agosto de 2011.
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